sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Flat Iron Building - Análise de uma Imagem


A fotografia analisada, intitulada “Flat Iron Building”, é de 1903, em preto-e-branco, e possui formato retrato com proporção aproximada de 2:1. Foi produzida pelo fotógrafo americano Alfred Stieglitz, e retrata uma cena urbana iluminada por luz natural, muito difusa e suave. O aspecto acinzentado de um dia frio e nublado de inverno diminui o seu contraste.
A imagem é composta predominantemente por linhas retas formadas pelas árvores, cercas, e mais ao fundo pelo prédio e suas janelas.
Em primeiro plano vemos o tronco de uma árvore, posicionado no terço direito, que se bifurca no terço superior, conduzindo o olhar para um dos pontos áureos da fotografia e conferindo à composição um efeito plástico extremamente interessante. Finos galhos aparecem no canto superior esquerdo, ajudando a emoldurar a cena. A escala de cinza tem seu tom mais escuro nesse tronco, ficando cada vez mais claro à medida que os elementos vão se afastando do primeiro plano, intermediada pela neve no chão, até chegar ao prédio ao fundo, que se funde com o céu, formando assim uma perspectiva tonal que, aliada à perspectiva cônica com dois pontos de fuga evidenciada pelo prédio juntamente com a escala dos elementos próximos e distantes, cria o volume e a profundidade da obra.
A composição é harmoniosa e possui um equilíbrio extremamente requintado, pois o balanceamento dos pesos visuais não é feito simplesmente com formas semelhantes distribuídas uniformemente, o que conferiria um aspecto monótono e estático à obra, mas sim através de compensações mais complexas onde uma grande massa com tom claro é equilibrada por uma forma menor e mais longilínea com tom escuro, onde a divisão horizontal ao meio da imagem pela linha formada pelo topo das copas das árvores é balanceada pela utilização dos terços, e onde a rigidez das linhas verticais é quebrada pelas linhas inclinadas e sinuosas. Assim, o autor criou esse estado de tensão tão sutil, conferindo à obra sua grande qualidade de possuir um ritmo calmo, lento, silencioso, sem em nenhum momento ser enfadonha ou desinteressante.
O elemento natural, representado pelo tronco da árvore em primeiro plano, dialoga diretamente com o elemento construído pelo homem, representado pelo prédio ao fundo.
O efeito da luz sobre a imagem, assim como a indumentária de época da mulher com sua roupa volumosa e acinturada e o homem com sua cartola, nos remete às pinturas dos impressionistas Claude Monet, Édouard Manet e Pierre- Auguste Renoir.
A objetiva escolhida foi uma tele-objetiva, comprimindo os planos e diminuindo a distância aparente entre os elementos criada pelas perspectivas tonal, cônica e de escala. A granulação, apesar de fina, é presente na imagem. Essa textura proporcionada pelos grãos de sais de prata, de tamanho maior nos filmes de maior sensibilidade à luz, aliada à estética preto-e-branco, reforça a idéia de um padrão hoje comumente atribuído às fotografias artísticas.
Apesar de registrar o ambiente urbano de uma época, reproduzindo um parque e seu paisagismo, pessoas e suas indumentárias, e um edifício e seu estilo arquitetônico, a fotografia se enquadra na categoria artística, ou autoral, onde prevalece a expressão do artista, com sua visão única de mundo, e a experiência estética ou conceitual que ele quer transmitir.
A importância dessa obra do começo do século XX não é de documentar um evento, registrar um acontecimento, ou ilustrar uma matéria, mas sim de mostrar que a fotografia também é uma linguagem de expressão artística, com seus códigos e técnicas próprios, cujo objeto resultante, a ampliação fotográfica sobre papel, pode ser uma obra de arte.
O autor possui muita sensibilidade e extremo domínio das técnicas fotográficas e artísticas.
“Flat Iron Building” captura nosso olhar e exige um certo tempo de observação, com vários detalhes que vão se revelando aos poucos, surgindo da névoa, diferenciando-se através de sutis variações de tons. Instiga-nos a continuar procurando, porém de maneira calma, ao mesmo tempo que convida à reflexão. Hoje, onde tudo acontece muito rapidamente e todos nós corremos sempre apressados, muitas vezes sem mesmo sabermos o porquê, essa obra tem o poder de fazer com que paremos um pouco, transportando-nos para um lugar mais tranquilo, cumprindo com sua função expressiva de estimular a fruição.


Texto escrito por Rogério Ceneviva para a disciplina "Estética e Pensamento Fotográfico", ministrada pelo Dr. Isaac Camargo na Pós-Graduação em Fotografia da Unopar.



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